quarta-feira, 11 de maio de 2011

PRINCÍPIOS DA EDUCAÇÃO/ FORMAÇÃO EM ECONOMIA SOLIDÁRIA



Os processos educativos/formativos têm como princípio e, ao mesmo tempo como horizonte, os valores e práticas da Economia Solidária – economia esta que existe não apenas como projeto de novas relações econômicas e sociais, mas também como realidade construída e reconstruída, cotidianamente, pelos sujeitos que a constituem. Inspirados na cooperação e autogestão no trabalho e em todas as instâncias de produção da vida, o ponto de partida dos processos educativos/formativos é a ação solidária, compreendida como atividade humana que, contrapondo-se aos princípios da competição e do individualismo, orienta-se na horizontalidade das relações entre os seres humanos, independente de suas condições de gênero, etnia, religiosidade ou cor-de-pele.
A educação/formação em Economia Solidária tem em conta a solidariedade em sua dimensão ontológica (condição humana, constitutiva da vida social), bem como as diferentes concepções e práticas de solidariedade que se manifestam nos diversos espaços/tempos históricos e, inclusive, convivem num mesmo espaço físico/subjetivo. Sintonizando-se na potencialização de redes de colaboração solidária, as práticas pedagógicas propiciam a sobrevivência e a melhoria da qualidade de vida, favorecendo a construção de “redes de proteção social”. Além disso, fortalecem a organização dos trabalhadores e trabalhadoras em torno de um projeto econômico-social que privilegia a valorização do trabalho (e não do capital). Para tal, ao mesmo tempo em que se substancia na denúncia da exploração do trabalho, na crítica à lógica excludente da economia capitalista e ao sistema opressor que fragmenta o ser humano (dividindo a sociedade entre “compradores e vendedores de força de trabalho”), os processos educativos inspirados na Economia Solidária anunciam uma nova sociabilidade, uma nova sociedade, uma nova forma de produção da vida.
A educação/formação em Economia Solidária implica na construção de novas relações entre as pessoas e, também, entre elas e a natureza (da qual os seres humanos são parte integrante). Estimulando processos de trabalho e práticas sócio-ambientais que respeitam e preservam a biodiversidade da flora e fauna, assim como dos demais elementos que compõem o meio ambiente, as práticas educativas buscam o reencontro dos seres humanos consigo mesmo, com o planeta e com o universo.
Como nos demais processos autogestionários de produção da vida, a educação/formação tem como perspectiva o trabalho-criação, no qual homens e mulheres têm o controle sobre todo o processo (produção, administração, beneficiamento, distribuição, troca e consumo ético/critico/consciente dos frutos do seu trabalho). Ao invés da acumulação privada da riqueza, a finalidade da atividade econômica é o próprio ser humano; neste sentido, como nos demais processos de trabalho que têm a Economia Solidária como musa inspiradora, os processos educativos fundamentam-se no exercício prático da democracia, contribuindo para que todas as pessoas envolvidas, reconhecidas como sujeitos de conhecimento, possam resgatar os sentidos do trabalho, construindo sua autonomia como atores econômicos, construtores de história e de cultura. Concebidos, também, como processo de trabalho, os processos educativos promovem a construção coletiva de conhecimentos e de novas práticas sociais, através da participação – entendida como princípio emancipador dos trabalhadores e trabalhadoras.
Ao resgatar valores e práticas que nos encaminham para o exercício de uma ética calcada numa solidariedade consciente, as práticas educativas/formativas que se espelham nos princípios da Economia Solidária, contribuem para a auto-estima do grupo de trabalhadoras e trabalhadores associados, estimulando o desenvolvimento de todas suas potencialidades como seres humanos. Defendendo o respeito à vida em todas as suas dimensões e incorporando a afetividade e a sensibilidade como elementos de formação humana, os processos educativos favorecem a redescoberta do sentido do fazer, o reencontro do prazer da criação. Neste horizonte, a música, a dança, o teatro, as artes plásticas e outras manifestações da cultura são considerados elementos constituintes das práticas educativas/formativas. Em especial, o resgate da cultura popular e a incorporação dos bens simbólicos e experiências concretamente vividas (mas não valorizadas pelo sistema capitalista), tornam-se também um importante desafio.
Respeitando as afinidades já existentes entre as pessoas, respeitando também o tempo de caminhada de cada grupo e de cada um dos trabalhadores e trabalhadoras da Economia Solidária, as ações pedagógicas percorrem caminhos que propiciam a reintegração dos saberes que o capitalismo fragmentou, articulando-os às práticas cotidianas de vida e trabalho, de maneira a favorecer o nexo entre ação/reflexão/ação. Indo além do ativismo e da mera “ação-militante”, cabe aos educadores buscar os meios para incorporação de referenciais teórico-metodológicos que ajudem na compreensão e transformação da realidade, estimulando a criação de novos conhecimentos que possam ressignificar valores e práticas sociais. Como forma de fortalecer as redes de colaboração solidária, ganham destaque especial os intercâmbios das práticas de Economia Solidária, inclusive, experiências de educação/formação.
Outro desafio da educação é criar um espírito investigativo coletivo, capaz de envolver todos os atores dos processos de formação, tanto para desvelamento do mundo como para busca de caminhos que favoreçam transformações políticas, econômicas, sociais e culturais. Por não existir neutralidade nas relações econômicas e sociais e tampouco nas práticas educativas, a educação deve ser concebida como um ato político a favor da emancipação humana, constituindo-se em um espaço de lutas, contradições e disputas. Por meio da ação dialógica problematizadora que garanta horizontalidade das relações sócio-educativas, a autoridade do educador é validada na própria pratica pedagógica libertadora. Para tal, é necessário o respeito à alteridade, ou seja, respeito ao outro em todas as suas diferenças (religiosas, étnicas, de gênero, ideológicas, sexuais, etc.).
O conjunto de ações político-pedagógicas pressupõe conteúdos e metodologias de trabalho cujos horizontes vêm ao encontro dos princípios da Economia Solidária. Considerados como momentos educativos, inclusive para os próprios trabalhadores-educadores, a avaliação e sistematização das experiências concretas dos trabalhadores e trabalhadoras acontecem de forma permanente, permitindo a (re)construção das práticas sociais e dos sentidos do trabalho. Em outras palavras, o próprio trabalho é concebido como instância e como princípio educativo, cujo horizonte é criação coletiva de uma nova cultura do trabalho, de novas relações econômico-sociais.

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